O embondeiro é uma árvore-símbolo, quase sagrada, que se encontra em África quase em toda a parte. Dá um fruto estranho, que consiste numa pasta branca, que me faz lembrar esferovite e está num invólucro verde acinzentado. Esta fruta, chamada múcua, faz-me lembrar uma outra imagem: a de grandes ratos suspensos da árvore pela cauda… Até há poucos anos considerada quase sem préstimo (embora eu sempre tivesse gostado muito dela), a múcua hoje é usada em profusão em sumos, sorvetes e ainda em chá para, dizem-me, tratar a diabetes.
O embondeiro fascina-me e gosto de me sentar debaixo de um, quando posso e quero pensar. Ele transmite-me uma segurança, um sentimento de protecção, uma dimensão do meu tamanho que não consigo explicar mas que sinto passar da árvore para mim de uma forma quase palpável. É o lugar escolhido, nas comunidades, para se resolverem assuntos importantes e uma “conversa debaixo de embondeiro” é uma conversa para dar conselhos, para partilhar saberes.
Dos seus troncos largos, muito grossos na parte inferior, saem braços (não consigo vê-los como ramos) que se elevam ao céu numa prece permanente. E, por algum dom que não sei se devo agradecer ou lamentar, eu ouço os braços do embondeiro, na sua oração contínua. E o que ouço é isto:
Meu Deus, olha para África!
Estendo os meus braços para Ti,
Creio que me fizeste assim grande e forte
Para que o meu grito chegasse aos Teus ouvidos.
Senhor, olha para os Teus Filhos Africanos,
Temos sede e fome de justiça,
Clamamos pela tua misericórdia.
Porque quando não tivermos fome e sede de justiça,
Também o nosso corpo ficará saciado.
Meu Deus, estendo os meus braços para Ti,
Porque estamos esquecidos e ninguém ouve
Os gritos das nossas crianças quando vão dormir com fome.
Abre os Teus olhos para ver as suas faces secas,
Porque as nossas crianças choram sem lágrimas.
Os meus frutos baloiçam ao vento, Senhor,
E pedem-te que ensines os nossos próprios Irmãos
A olharem para nós fraternalmente.
Não deixes, oh meu Deus, que o pão que mataria a nossa fome
Seja transformado em máquinas de morte entre nós mesmos.
Meu Deus, olha por África,
Porque ela está sedenta de Ti,
E Te ama e respeita em todas as Tuas criaturas:
Vêem em mim a Tua força e estatura,
Respeitam os rios, as montanhas e os vales,
Nunca se esquecem de Ti, chamando-te por mil nomes.
África, África, suplicam os meus braços estendidos!
Abre os Teus ouvidos, ouve a minha voz, Senhor,
Protege-nos com o Teu Amor, somos Teus Filhos também.
O meu povo acredita que Tu falas através de mim,
Vem tratar das suas makas debaixo dos meus ramos
Os mais novos confiam nos conselhos
Que ouvem da boca dos mais velhos
Encostados ao meu tronco robusto.
Não desiludas o meu Povo, Senhor, ouve a minha voz
Que os meus braços elevam até Ti.
Nós esperamos. Sempre esperaremos.
África é, como a fizeste, Tempo e Espaço.
8 comentários:
Outro nome: Irmã embondeiro...
Com que fortes e carinhosos braços acolhe os esfomeados, daí e daqui, dando-lhes a beber a seiva doce dessa alma-raíz tão poderosa.
Tenha um santo dia, Carmo.
Ó Elsa, tens razão, nada melhor pode caracterizar a Carmo, IRMÃ EMBONDEIRO. Com toda a carga poética e matafórica que ela encerra.
E Carmo, eu lembro-me do sabor agridoce que o fruto do embondeiro tinha ao derreter-se na boca. Mas não imaginava que dele agora fizessem sumo e muito menos sorvetes e chá. Os mistériios da natureza e da mãe África.
Que bela oração no dia de hoje.
No meu postal de Hoje sobre o dia do Corpo de Deus vou colocar uma adenda com enlace para esta oração.
E termino a convidá-la a ler as palavras do seu bom CCz em comentário deixado aqui:
http://balancedscorecard.blogspot.com/2008/05/em-busca-de-um-monoplio.html
Uma boa semana IRMÃ EMBONDEIRO DO SEU IRMÃO SORRISO.
Vocês estragam-me com mimos, é o que é, Irmã Elsa e Irmão Sorriso. Embora estejam mais próximos de vos chamar "meus Filhos"...
Um beijinho da Irmã Emboneiro
O que nós vimos aqui aprender.
Não há dúvida que essa árvore só pode inspirar protecção.
Como gosto de bonecos fez-me lembrar a POCHAONTHAS A FALAR COM A SUA ÁRVORE,que lhe dava sempre
protecção e bons conselhos.
Ainda um dia aí irei, sinto esses
cheiros da terra como se já lá estivesse estado, é estranho.
Uma boa noite, estou cansadinha hoje, preciso de uma boa noite de
sono estou ainda anestesiada,quem sabe se o embondeiro me faria bem!!
Que delícia de oração. Dá mesmo vontade de me sentar debaixo de um embondeiro. Nunca tinha ouvido falar de tal árvore-mistério que guarda tantos silêncio, e acolhe em seu regaço quiça tantas dúvidas, medos, inseguranças. E ao mesmo tempo é conselheira, afável, mãe...
Também me vou sentar este fim-de-semana a descansar, mas deve ser debaixo de uma oliveira ou de um sobreiro... árvores que abundam no meu Alentejo e circundam a minha casa. Espero que Deus também me ilumine e que estas árvores elevem ao céu a mesma oração do seu embondeiro (neste caso, ligeiramente adaptada, claro).
Um grande beijinho para si e para essa terra linda de onde emana serenidade para todos os cantos do mundo.
O ccz é um poeta, é um filósofo.
Veja o meu blogue.
Ele nao sabe de nada.
Beijinhos de D´dorf!
Quantos braço-abraços para o a enlear? Prometo braços nús no enlace, para tornar mais sedoso o laço!
Estando longe, essa roda de carinho só pode ir de afago de olhar CC.
Ao passar por aqui deparei-me com uma árvore de que gosto particularmente. Mais uma aproximação. Gostava de estar sentada debaixo duma neste mesmo instante.
Vou ficar a pensar nisto.
Bjs
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