segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Onde estará a Virtude?

Diz-se que os provérbios ou ditados são sabedoria, pois foram criados a partir de milhentas ocorrências que pareciam garantir a sua Verdade para além do Tempo. Pois já sabemos que não é assim, visto que a tecnologia (ia a chamar-lhe progresso mas desisti a tempo) tem mudado as coisas. Por exemplo, um ditado antigo dizia que "mal vai a Portugal se não há três cheias antes do Natal". Ora as barragens tiraram significado a um provérbio muito útil num país predominantemente agrícola mas que agora nada significa. Outro dizia: "se quiseres comer bem, come as ervilhas com os ricos e as cerejas com os pobres". Este felizmente vai desaparecendo, mas queria simplesmente dizer que as melhores ervilhas eram as primeiras, tenrinhas, mas tão caras que só os ricos as podiam comprar, enquanto as melhores cerejas são as últimas, aquelas que já ficam tão baratas que até os pobres se podiam deliciar com elas.
Na minha aldeia havia um ditado que nunca ouvi em mais lugar nenhum e que era, por si só, todo um tratado sobre a situação de pobreza do Portugal rural (e note-se que esta aldeia está a uns 15km de Coimbra). Como os pais mandavam as crianças "roubar" fruta aos pomares ou fruteiras quando estes lhes pediam pão, corria este: "Da cereja ao castanho, bem me avenho; da castanha ao cerejo, mal me vejo". O que significava que, a partir de Maio, com as primeiras cerejas, até Novembro, com a chegada das castanhas, as crianças tinham muito por onde enganar a fome. Mas de Novembro a Maio, o caso fiava mais fino, porque não havia fruta. Sei de quem enganava o estômago com flor de marmeleiro, que é das primeiras a aparecer, muito adocicada. Já provei. E acho muito interessante a inversão do género da fruta, para rimar a preceito.
E que tem isto tudo a ver com o título? É que se diz que "no meio está a virtude"... Será?
Não sei porquê, isto faz-me lembrar a "aura mediocritas" e fico logo desconfiada. Não gosto muito de médias. Lembro-me logo de que se tu comeres uma galinha e eu nenhuma, na média comemos ambos meia galinha...
Pois é: eu gostaria de saber onde está a Virtude. E já agora dizer que apreciei ontem uma personalidade da nossa praça política, de clara e conhecida prática cristã católica, afirmar que certas acções que fazemos valem bem por vinte missas. Dão-se alvíssaras a quem disser quem o disse, a que acções se referia e em que local ou meio se exprimiu.

5 comentários:

Pedrita disse...

realmente pensar no que é virtude é muito complexo. excelente texto. se roubar para matar a fome não é virtude, o que seria então? beijos, pedrita

f@ disse...

Onde estará?... na boca dos politicos não será decerto...

Que os provérbios tem aquele sabor de sempre... e até podemos brincar ... há até quem o faça à procura de novos sentidos...
beijinhos das nuvens

Jorge Bastos Malheiro disse...

Olá, Carminho! Ainda bem que estás de volta.
A Virtude, na minha opinião (e não só), não é um conceito absoluto mas sim relativo da sociedade em que vivermos. E fazer juízos de valor é algo perigoso e que deve ser feito com muita prudência e com pleno conhecimento dos factos.

Já na Bíblia está escrito
Mateus 7:1
Não julgueis, para que não sejais julgados.

Mateus 7:2
Porque com o juízo com que julgais, sereis julgados; e com a medida com que medis vos medirão a vós.

Desde as cruzadas, da Santa Inquisição e do fundamentalismo islâmico até aos «pequenos» dramas do dia a dia, a vida está cheia de dor e lágrimas causadas por aqueles que, por soberba e em nome da SUA moral, da SUA ética e da SUA virtude, querem impor aos outros os seus próprios conceitos e valores arvorando-se em únicos defensores da «verdade». E o mais grave é que a toda a hora fazem juízos apressados e demolidores sem se preocuparem minimamente, nem a apurar a totalidade dos factos nem com os sentimentos das pessoas atingidas por esses mesmos juízos.

E a realidade é que, todos nós, temos dois modos de julgar, um duro e rígido para com os outros e outro, bem mais complacente, quando nos julgamos a nós próprios.

A este propósito, parece-me útil recordar um pequeno texto para sobre ele meditar um pouco:

(quote)

ELE E EU

Quando ELE não acaba o seu trabalho, digo: É PREGUIÇOSO
Quando EU não acabo o meu trabalho, digo: ESTOU MUITO OCUPADO

Quando ELE fala de alguém, é MALEDICÊNCIA
Quando EU falo de alguém, é CRÍTICA CONSTRUTIVA

Quando ELE mantém o seu ponto de vista, é TEIMOSO
Quando EU mantenho o meu ponto de vista, SOU FIRME

Quando ELE não me fala é UMA AFRONTA
Quando EU não lhe falo é um SIMPLES ESQUECIMENTO

Quando ELE demora muito tempo a fazer alguma coisa, é LENTO
Quando EU demoro muito tempo a fazer algo, sou CUIDADOSO

Quando ELE é amável, é porque TEM UMA SEGUNDA INTENÇÃO
Quando EU sou amável, é porque SOU VIRTUOSO

Quando ELE vê os dois aspectos de uma questão, É OPORTUNISTA
Quando EU vejo os dois aspectos de uma questão, SOU COMPREENSIVO

Quando ELE é rápido a fazer qualquer coisa, É DESCUIDADO
Quando EU sou rápido a fazer alguma coisa, SOU HÁBIL

Quando ELE faz algo sem lhe pedirem, METE-SE NO QUE NÃO LHE DIZ RESPEITO
Quando EU faço algo sem me pedirem, TENHO INICIATIVA

Quando ELE defende os seus direitos, É UM CONFLITUOSO
Quando EU defendo os meus direitos, MOSTRO QUE TENHO CARÁCTER

Y. Blondel (Boletim de Informação da Associação do Canadá)

(unquote)

Julguemos os outros? Pois sim, mas com a tolerância e a compreensão que usarmos para nós próprios. E se o que eles fizerem não prejudicar ninguém, quem somos nós para os julgar?

Tem um dia feliz

Licas disse...

Saber onde está a virtude é realmente de difícil resposta porque cada indivíduo tem a sua identidade própria, a sua formação respectiva e a visão do mundo e das formas de agir estão muito de acordo com estas variáveis. Aquilo que para uns é virtude, para outros não é mais do que o que tem que ser feito, de acordo com a sua consciência.
Quando outros julgam que alguém é virtuoso, se perguntassem a esse alguém diria "porquê? estou apenas dentro dos parâmentros normais de comportamento".
Os virtuosos nunca acham que o são e se calhar nem acreditam na virtude como ela parece significar.

Será que estou a ver bem o problema?

Aproveito para relembrar o desafio colocado em Maio passado e cujo texto transcrevo:

Caros Amigos

Muitos daqueles que se mostraram interessados neste desafio, demonstraram que os prazos previamente definidos comprometiam a sua participação. Uns porque estão com muito trabalho de final de ano lectivo, outros porque têm que estudar ou acompanhar os filhos ...
Ponderei e achei que, para termos mais pessoas envolvidas se devia alargar o tempo de participação.
Assim o tema que abaixo colocarei poderá ser tratado, ao ritmo de cada um, até final de Setembro.

Que dizem?
Estará melhor assim?

Espero desta forma agradar a todos e de todos obter a participação.

O tema será:

A FAMÍLIA - TRANSMISSÃO DE REFERÊNCIAS E VALORES

Com muito carinho fico a aguardar a vossa criatividade.

Um abraço
Licas

Anabela Magalhães disse...

Excelente pergunta. Subscrevo-a sem me adiantar na resposta. :)
E aleluia que há novidades neste blogue!!!