segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

A minha Mensagem de Natal

Amigos, não me lembro de, já no dia 8 de Dezembro, ter ouvido dizer tão poucas vezes "BOAS FESTAS!". As lojas estão cheias, os centros comerciais à pinha, mas parece que andamos todos voltados para dentro e não vemos mais nada. Quando me atrevo a dizer Boas Festas! raramente tenho recebido mais do que um olhar rápido e surpreso.
Este ano, na sequência de anos anteriores, os Amigos, aqueles que amo, independentemente do que sentem a meu respeito, vão receber os meus pensamentos sobre eles como presente de Natal. E o que sinto e penso é assim:
Quando os teus ombros vergarem de cansaço,
Eu tomarei o teu carrego com a minha Amizade;

Quando o sono fugir de ti e te deixar a Preocupação por Companhia,
Chama por mim, a tua Amiga,
E eu te cantarei uma canção de Amizade até adormeceres;

Quando deixares de acreditar naquilo de que és capaz,
Eu, a tua Amiga, estarei a teu lado

Para te recordar e ajudar a dar o primeiro passo;
Quando a Tristeza quiser ser a tua Companheira,
Eu, a tua Amiga, a afastarei de ti.
E se tal não for possível,
Ficarei contigo para que a possamos dividir;

Quando o Sol não for suficiente para iluminar o teu dia,
Eu, a tua Amiga, tudo farei para que vejas a luz;

Quando te propuseres um desafio quase impossível,
Conta comigo, a tua Amiga,
Porque estarei ao teu lado incondicionalmente.

Porque, meu Amigo, minha Amiga,
É assim que eu te vejo na minha vida.
Porque, meu Amigo, minha Amiga,
É assim que me sinto na tua vida,
Todos os dias, mesmo quando não estamos no Natal.
Porque, meu Amigo, minha Amiga, afinal,
Só porque tu existes,
Todos os dias, para mim, sabem a Natal.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Desculpem, assim não brinco!

Provavelmente, as palavras que vou escrever vão causar-me inimizades, mas tenho aqui algo entalado na garganta e se não o disser, rebento. Além disso, estou avançada por demais na idade para ter medo de dizer o que penso. E o que penso é que professores e Professores, assim, estão a perder a face. Assim, como?
Olhem, assim, é, por exemplo, o "folclore" de muitos nas manifestações. Nós somos PROFESSORES! Professores têm que ter um porte, uma postura, que os dignifique. Professores não manifestam a sua indignação com versinhos de pé quebrado!
Por outro lado, a muitos falta apresentação! Sim , apresentação. Somos PROFESSORES! Não podemos falar de qualquer maneira! Não devemos apresentar-nos de qualquer maneira!
Concordo a 100% com a recusa deste modelo de avaliação. A 200%, até. Mas NÃO CONCORDO que se espere e se lute para ficar tudo na mesma. Os professores não são todos iguais e cada um de nós o sabe. A curva de Gauss não engana e a nossa própria experiência nos diz de quantos Professores nos lembramos. Cada um de nós sabe avaliar-se? Eu teria tido vergonha de acabar a minha carreira com a mesma classificação de outros colegas, porque sei o que fazia e o que eles faziam. Mesmo assim, reconheço que havia, na minha Escola, Professores, no meu grupo, melhores do que eu, pelo menos uma.
Sabem o que vos digo, Colegas? Lutemos por uma avaliação justa, para nós e para a nossa função - a mais digna, a mais alta: preparar o futuro. Mas deixemos que o nosso trabalho fale por si e não pensemos que poderemos ser todos generais. Aviso que não saí como general... Talvez tenente-coronel...
Talvez as quotas sejam curtas, sim, mas sejamos honestos: há, de facto, maus professores, medíocres, normais, bons, muito bons e excelentes. Como em todas as profissões, não nos iludamos. Portanto, apesar da força dos números da greve, creio que a Ministra, caladinha como está, está a investir na sua posição, enquanto nós, pedindo uma coisa que não estava, até agora, explicitamente a ser tratada, vamos perdendo o nosso capital de simpatia por parte do resto da sociedade.
Como pedi no aragem.blogspot., quem não gostar, diga-o aqui. Obrigada.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Esqueci-me...

Esqueci-me de dizer no poste abaixo que também aprendi que se pode mudar o dia falando com alguém que nem se conhece, no cabeleireiro. Olá, Anabela, Professora de Educação Visual! Coragem!

O que aprendemos simplesmente vivendo

Todos nós recebemos mails de variadas temáticas: anedotas, fotografias, lamechices, textos de índole religiosa, sei lá que mais. Alguns são bem interessantes e é pena, na maior parte das vezes, estarem escritos em brasileiro, língua de que, aliás, muito gosto na forma oral. Hoje, dediquei algum do meu tempo, após as tarefas pesadas de preparação dos locais onde repousam os meus mortos, a “limpar” o correio. Encontrei um texto de há muito tempo (9 de Março de 2003) e que me vou permitir reescrever, usando-o a ele e à minha própria experiência. Creio que vale a pena.

APRENDI
Ao longo da Vida aprendi muitas coisas vivendo, simplesmente. Sem frequentar nenhuma Escola. Vejam o que aprendi:
Que a melhor escola do mundo está nos pés dos mais velhos.
Que quando estamos apaixonados não há forma de evitar que se saiba.
Que mesmo que uma só pessoa me disser "Fizeste-me ganhar o dia!", o meu dia está ganho.

Que adormecer uma criança nos meus braços é uma das maiores sensações de paz do mundo.
Que ser generoso é mais importante do que ter razão.

Que nunca se deve dizer "não" ao presente de uma criança.
Que quando não tenho condições de ajudar uma pessoa, posso, pelo menos, rezar por ela.
Que não importa até ponto a vida me obrigue ser sério, hei-de precisar sempre de um amigo para brincar.
Que, às vezes, tudo o que precisei para continuar foi ter uma mão para segurar e um coração para me entender.
Que os pic-nics que fizemos com os filhos quando eram pequenos fizeram maravilhas na forma como vemos a Natureza.
Que a vida é, muito prosaicamente, como um rolo de papel higiénico: quanto mais perto do fim, mais depressa passa.
Que devemos estar contentes por Deus por não nos ter dado tudo o que pedimos.
Que o dinheiro não compra a elegância nem o bom gosto.

Que são aqueles pequenos acontecimentos diários que fazem a vida tão espectacular.
Que debaixo de qualquer couraça há sempre alguém que precisa de reconhecimento e amor.
Que Deus não fez tudo num dia e que, portanto, não há nenhuma razão para eu julgar que o posso fazer.
Que ignorar os factos não altera a sua importância nem os faz desaparecer.

Que o amor, e não o tempo, cura todas as feridas.
Que a maneira mais fácil de crescer como pessoa é cercar-me de pessoas melhores do que eu.
Que não há melhor forma de receber alguém do que vestir um sorriso verdadeiro.

Que ninguém é perfeito até que eu me apaixone por alguém.
Que as oportunidade que desperdiço não se perdem porque alguém as vai aproveitar.
Que quando se cultiva a tristeza, a felicidade vai bater a outra porta.
Que gostaria de ter dito mais vezes a muitas pessoas que as amava e só o descobri quando elas já tinham partido.
Que se deve usar palavras suaves e macias porque, talvez um dia as tenhamos que engolir.
Que um sorriso é a forma mais barata de se melhorar o visual.
Que não há ninguém mais fortemente sedutor do que um bebé quando segura o nosso dedo na sua mãozinha.

Parecem lamechices também? Pois pareçam! O facto é estas são verdades que também eu aprendi com a Vida!

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

De Deus, da Igreja, de nós, Homens e Mulheres

Este poste de hoje é um risco que vou correr e faço-o depois de ler um poste de uma Colega, Pessoa de Bem e que, como tal, tem o direito de pensar pela cabeça dela. Vou falar do que menciono em título mas desde já aviso que só vou dar a minha opinião pessoal. Portanto, que ninguém se ofenda, pois o meu objectivo é acalmar as pessoas que se sentem frustradas, tentar transmitir a Paz que Deus me dá.
Vou começar pela Igreja. A Igreja foi criada pelos homens, e é, portanto, o seu reflexo, com coisas boas e más. Não se pode admitir o que, ao longo da História, se fez em nome Deus e com o beneplácito claro ou tácito da Igreja: as Cruzadas, a Inquisição, a missionação de tantos povos, feita através de muito sofrimento e maldade. “Em nome de Deus te mato”, que enorme sacrilégio!
Mas não estou só a falar da Igreja Católica, refiro-me, claro, a todas as igrejas. Nos locais mais recônditos da Terra, em todos os estádios civilizacionais, adorando um Deus diferente mas sempre um Deus, os que se reclamam da intimidade com o divino não raro a têm usado para causar o Mal e o Sofrimento.
Bem, agora a Igreja Católica. Parece a que prevalece em Portugal. Não acredito: a maior parte dos que se dizem católicos só procuram a igreja (edifício e instituição) três vezes na vida e mesmo assim só uma vez vão por vontade própria: para o casamento. De resto, são levados para cumprir a tradição e serem baptizados e são levados quando morrem, por tradição e “por causa do que não se sabe...” Vale mais prevenir do que remediar.
Ora não há dúvida que o clero precisa de se actualizar. Afinal, tudo mudou e não podemos encarar as pessoas e as coisas com olhos velhos. Mas com uma ressalva, que é convicção minha: Deus é O que é, sempre, não muda no Seu Amor por nós e ponto final! Agora, os seus servidores, os padres, são humanos, coitados: podem ser pouco generosos, pouco humildes, pouco modestos, pouco competentes em relações humanas. Podem ser tudo o que os outros homens são. Não deveriam, mas podem sê-lo. E o único juiz que vejo como adequado e competente para os julgar será Deus e não nós.
Por exemplo, se eu fosse agnóstica ou ateia e recebesse uma carta a pedir-me que contribuísse para a sustentação do clero, mesmo que escrita de acordo com as normas de uma correspondência normal, sem acusações implícitas ou explícitas, eu responderia ao sacerdote a comunicar-lhe a minha posição perante o culto e solicitaria que, tendo tal informação em conta, agradecia que não me voltasse a contactar para o efeito. Se recebesse a carta que a Anabela recebeu, eu faria tudo isso mas acrescentaria, com muita caridade, a minha opinião de que não me parecia generoso estar a exigir explicações e muito menos a prestar “com modéstia e humildade”…
Mas, sendo católica, reconheço a importância do sacerdote e se quero que ele se entregue à sua missão em exclusividade, então é minha obrigação moral contribuir para o seu sustento e para ter um nível de vida no mínimo decente. Só isso me dá direito a esperar que ele esteja disponível para me ouvir, para se preparar para ser um bom sacerdote, para se actualizar. E para ajudar aqueles que não o podem sustentar. Ou então NÃO DIGO QUE SOU CATÓLICA. Mais: há muitas coisas que não sabemos (e nem é obrigatório que saibamos) sobre o destino que os padres dão aos emolumentos que recebem. Posso garantir.
Agora, falemos de Deus e dos Homens e Mulheres. São cada vez mais os que dizem não crer em Deus, não acreditar em Deus. São também cada vez mais aqueles que O procuram por caminhos variados. Aceito no meu coração uns e outros, sem a mais leve censura, que seria falta de Amor. Mas sinto-me tão feliz por acreditar! Que bom é acreditar neste Deus Bom, todo Amor, que me conhece desde o princípio de tudo, que sabe quantos são os cabelos da minha cabeça, que me dá inteira liberdade para viver e que espera que eu aja de maneira a que Ele não se envergonhe de mim! Que bom é conhecer este Deus que perdoa sempre, que lê no mais profundo da minha alma imortal, que me dá Consolo nas dores e Esperança quando todos os caminhos se parecem fechar para mim!
Posto isto, terminemos com a frase um tanto enigmática de Cristo: “A César o que é de César e a Deus o que é de Deus” ou “ A côngrua ao Padre que a merece e os impostos às Finanças…”

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Coitadita de mim...!

Sim, coitadita de mim, que sou uma pessoa sem nada de especial e que recebe, por certo imerecidamente, tanto carinho de todos os que aqui vêm visitar-me. Não ando fugida, não: apenas ocupada em outras lides e sem ter todo o tempo de que dispunha para blogar à vontade...
Quero aqui responder a todos, dizendo que continuo lúcida (até os loucos se julgam lúcidos, por isso esta recomendação não faz muito sentido...) na apreciação do que se passa à minha volta, que sinto uma enorme preocupação com a situação actual, que me custa não ver dirigentes à altura, capazes de mobilizarem os Portugueses para o trabalho, a auto-estima bem orientada, o respeito próprio. E mais do que um, porque nós somos todos diversos. Farta de cantar a uma só voz devemos estar todos.
Olho à minha volta e fico zangada comigo: a minha primeira tentação é criticar. Ora eu não nasci para dizer mal, valha-me Deus! Mas o que é que vejo? Ontem fui a uma empresa de comunicação para simplesmente formatar a internet portátil numa pen em vez da placa que tinha. Na loja onde me apresentei, uma entre milhares das que agora pululam, especialmente nos centros comerciais, estavam sete (!) funcionários, três meninas e quatro meninos. Loja vazia. Não senhora, não faziam aquele trabalho. Só na loja técnica. Ali só se vendia. E na loja técnica só com hora marcada. Disposta a mudar de operadora se, pelo menos, não fosse bem atendida, lá fui à loja técnica com hora marcada. E apareceu-me um jovem simpático, que descomplicou aquele trabalho todo, que mostrou uma disponibilidade e uma simpatia inexcedíveis, que fez o que lhe pedi e o que não pedi, com um sorriso e uma forma de trabalhar que me puseram de bem com o mundo. E mais, sem ele o dizer abertamente, fiquei a saber que aquela operação poderia muito facilmente ter sido realizada por qualquer um daqueles "sábios" que estavam a fazer que faziam alguma coisa...
Como sabem, também sou Formadora. Privilegio a área das Relações Humanas. Pois um dia destes descobri que muita da formação que agora é dada de pacotilha aos novos exércitos de jovens que são necessários para alimentar esta economia de faz-de-conta, em que nada se produz e tudo se "serve", é baseada na teoria de que "distância é que é preciso. O cliente é chato (sic), exigente"!
Coisas boas para dizer: há um Professor chamado António que conquistou um aluno rebelde e o tem na mão! Com o recurso ao e-mail!
A "minha" oliveira que veio de Israel e que os alunos do Raul plantaram comigo no Colégio dos Carvalhos está radiosa!
Esta bela notícia foi-me transmitida por texto de uma aluna!
O meu neto mais velho está a subir as classificações de teste para teste e tem uma namorada que o "ajuda" a ser mais responsável!
Os meus dois outros netos, irmãos, continuam óptimos alunos!
O Pai deles, meu Filho, não desiste de pregar aos peixes e de mostrar o que se pode fazer para não nos afundarmos na recessão!
E as minhas palavras voltaram a ser jovens, limpas, renovadas!




quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Em tempo de crise... quanto menos se falar melhor

Na entrada deste blogue tenho-me situado entre o Porto e algures em Angola e Moçambique. Agora, para ser mais verdadeira, deverei dizer que me situo algures entre o Porto, Lisboa, Angola e Moçambique, embora por este ano de 2008 me deva circunscrever às duas cidades portuguesas.
Tenho andado calada, por várias razões: tenho novas responsabilidades na minha vida pessoal, tenho tido tarefas para cumprir aqui em Portugal ligadas às minhas actividades africanas, tenho naturais preocupações com a crise financeira (tenho filhos e netos e, por eles, temo o futuro), tenho andado à espera que assente a poeira docente.
Sim, sinto que está muita poeira levantada, e quando tal acontece sem ter uma causa natural (um vendaval, por exemplo), normalmente é para obscurecer qualquer coisa que não interessa que se veja. A senhora ministra dá entrevistas e continua a mostrar que tem os Professores em pouca conta. Alguns professores resolvem dar-lhe razão e fazem gala de mostrar em público atitudes que não os recomendam para a docência.
Fico incomodada quando os professores se expõem de forma menos própria, pois sinto que os melhores, os Professores, acabam por ser penalizados na opinião pública. E tal é injusto. Não acredito, há séculos, nos sindicalistas que não dão aulas, que se preocupam com as "carreiras" mas não com o trabalho dos Professores, sobretudo os mais jovens, nas escolas periféricas. Comecei ontem a ler "A Turma", e quase não consigo parar de ler, mas acabo por sentir que estou apenas a rever os martírios por que passou a Rosinha numa Escola dos arredores lisboetas, sem nunca ter tido o apoio de ninguém, dos colegas mais velhos ao sindicato, dos directores de turma ao Conselho Executivo.
A Rosinha (nome fictício de uma pessoa real) teve a sorte de, logo a seguir, ter sido colocada numa Escola do Porto. Logo no primeiro dia de aulas houve queixas dos alunos junto da direccão. No dia seguinte, eram os pais. A Rosinha apresentava-se vestida de preto, com uns óculos de aros pretos, feios, com o cabelo apertado num rabo de cavalo. Logo na apresentação disse aos alunos que não estava interessada em que gostassem dela. Ela estava ali para ensinar Inglês e não para gostar ou para que gostassem dela. Estranho, no mínimo.
As coisas poderiam ter tomado o caminho natural destas situações: inquérito, chamada ao C.E., palmadinhas nas costas aos pais e aos alunos, mas aquele C.E. n ão agiu assim. Um dos seus membros convidou a Rosinha para almoçar em sua casa, pediu-lhe que tirasse os óculos, que soltasse o cabelo e viu que estava perante uma jovem e bela Professora assustada. Os óculos não tinham graduação. A Rosinha contou todas as suas ilusões desfeitas, a vontade de encontrar outra actividade, o abandono em que se encontrava depois de um ano em que tinha sido sujeita às provas mais difíceis e ofensivas junto de alunos a roçar a marginalidade. E recebeu a certeza de que ali, naquela Escola, ela poderia gostar dos Alunos e deixar que eles gostassem dela. Ela poderia apresentar-se com o era, com a certeza de que não seria incomodada com piropos torpes. Ela poderia acreditar que, se fosse preciso, receberia a ajuda necessária. Hoje, é uma PROFESSORA sem medos, confiante.
Será que ela pensa que está tudo bem na Escola? Não. Ela sabe que não está. Mas sabe que pode ajudar a melhorar.
Os docentes tiveram que receber formação por causa do computador Magalhães. Avaliaram essa formação como inadequada, mal preparada, sem ligação aos objectivos que se pretendiam atingir. Que fizeram? Eu não gostei de os ver a fazer figuras ridículas. O que eu teria feito seria não só rebelar-me contra essa formação mas ainda explicitar muito claramente junto de quem de direito por que não estava de acordo com ela. Tudo o resto me faz lembrar a teoria do "quanto pior, melhor".
Também não tive ainda o gosto de ver Professores e Pais a manifestarem a sua preocupação por se entregarem computadores a mãozinhas que deveriam treinar a motricidade fina a pegar no lápis e desenhar letras. O computador no 1º ano? Só como brinquedo. E se se pode aprender a brincar, não será certamente com o computador.
Sei que há muitas razões de queixa contra a avaliação. Mas aquela que tenho mais mencionada ultimamente é a da papelada burocrática. E quem aparece mais papista do que o papa na situação? Muitas Direcções das Escolas.
Espero que a Anabela, a Teresa (da Teia), o Raul, o Existente Instante, o Cumpadre Besberto, o Clap, a Fátima, a Paula, o Zé, o Luís, em nome de todos os que não conheço, me compreendam. Sei o sacrifício que fazem todos os dias, sei como dedicam todo o seu tempo aos Alunos (o que não quer obrigatoriamente dizer escola), sei como chegam cansados ao fim do dia, mas também sei como resistem à tentação de deixar de serem o que sempre foram: excelentes Professores! Mesmo que a famosa curva de Gauss não contemple tantos excelentes...
Quanto à crise, continuamos a viver alegremente acima das nossas posses. Tudo porque "esta vida são dois dias e quem vier atrás que feche a porta"...

domingo, 5 de outubro de 2008

Dia Mundial do Professor

Logo de manhã sentei-me à secretária, liguei o computador, abri a Internet e procurei, entre aspas, o que poderia haver sob a designação de "Ser Professor". Encontrei 247 000 sites em que aparecia a expressão. Fiquei a ler, a ler, até que chegou a hora de preparar o almoço. Porque os Professores contam, sim, mas também comem...
Depois, estive a ler os jornais e a ver o que se dizia sobre o assunto do dia. Um pouco incomodada. Porque as mágoas daqueles que aprecio e admiro me doem também. Bem, mas de tudo o que li, o que me encheu a alma foram estas palavras de Rubem Alves que fui roubar ao Terrear:
"Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma, continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O professor, assim, não morre jamais..."
Perdoem-me por continuar assim, crente na missão que escolhi para ser a minha vida e por ainda acreditar em Utopias na minha idade. Não quero falar hoje em avaliações, em ministros, em papéis, em carreiras, nada disso.
Quero lembrar a alegria e o entusiasmo com que começo sempre uma aula, seja ela do que for. Quero saborear a lembrança de ver o rosto de um aluno com menos aptidões para a nossa disciplina a iluminar-se quando entende, quando integra em si um novo conhecimento.
Quero pensar na Emilia Melhorado, que se lembrou de mim a semana passada e andou à procura do meu endereço, ela que está na sua terra em Vila Nova de Foz Coa, para me pedir um conselho.
Quero, hoje, mais do que nunca, orgulhar-me da certeza de que, como disse o João Bernardo, alguém pode não ter feito algo de errado porque se lembrou de mim.
Parece um auto-elogio, não é verdade? E elogio em boca própria é vitupério, diz o ditado. Mas quando digo isto faço-o com a certeza de que dezenas, centenas, milhares de Professores o podem fazer também.
Fui Professora durante mais de 40 anos e apenas duas vezes dois alunos foram um pouco indelicados, com uma diferença de 10 anos entre as duas actuações. Mal lhes recordo o nome. Mas vejo à minha frente todos os rostos, todas as relações que se estabeleceram entre nós, todas as delicadezas, o carinho, as pequenas coisas cúmplices que nos uniam.
E neste dia em que os Alunos que passaram pela nossa vida talvez nos recordem com saudade, quero prestar a minha homenagem aos Professores que mais me marcaram:
- D. Magda, na 4ª classe, pelos desafios que nos lançava;
- Dra. Elsa, de Francês, pela delicadeza, aliada ao conhecimento, com que nos educava, naqueles tempos difíceis e lugares longínquos;
- Dra. Amélia, de Matemática, por nos mostrar para que é que ela servia, aquela Matemática de que tantas tinham medo;
- Dra. Hermínia Roberts, de Português, (e Reitora) por me ter entusiasmado com os Lusíadas;
- Dr. Barata, a quem carinhosamente chamávamos o Dr. Baratinha, baixinho, de Filosofia, que nos ensinava a raciocinar e a pensar pela nossa cabeça.
Vejam, de entre a multiplicidade de Professores que tive, quantos me ficaram no coração e na alma! E enquanto eu viver, estes Professores continuarão vivos.

Pois se é verdade que
"Ensinar não tem que ser mesmo um sacerdócio
Mas é mister de tão grande valor
Que, depois do Amor e do Ócio,
Não há nada maior
(Nem melhor)
Do que ser Professor"...

Sei que às vezes é duro, é difícil, mas está na nossa mão emendar o erro, trazer à tona a Verdade e a Razão. E não se zanguem comigo: vinte vidas tivesse eu, e para a vontade que tenho de aprender e ensinar, não seriam bastantes!
Para todos os Colegas, os meus desejos e votos sinceros de que possam, em breve, sentir o que sinto. Felicidades.

sábado, 4 de outubro de 2008

Dia de S. Francisco de Assis


Hoje é dia de S. Francisco de Assis e eu quero agradecer a todos os que se lembraram do meu simples aniversário. A todos e a cada um, o meu carinho grato e cordial (do coração). E a minha oração preferida, pois a considero um Programa de Vida.
Oração da Paz de S. Francisco de Assis:
Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz;
Onde houver ódio, que eu leve o amor;
Onde houver discórdia, que eu leve a união;
Onde houver dúvidas, que eu leve a fé;
Onde houver erros, que eu leve a verdade;
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;
Onde houver desespero, que eu leve a esperança;
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre,
fazei com que eu procure mais consolar,que ser consolado;
Compreender, que ser compreendido;
Amar, que ser amado;Pois é dando que se recebe;
Pois é perdoando, que se é perdoado;
E é morrendo que se vive para a vida eterna.
Tudo tão simples, como só poderia vir de uma alma simples, como a daquele a que chamaram "o Louco de Deus".
Um abraço cheio de Carinho da Avó Pirueta

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Comentário-resposta aos comentários do poste anterior

Vou responder aqui aos Amigos e Leitores que fizeram o favor de ler e comentar o poste do dia 27.
Primeiro: estamos todos de acordo em que a avaliação que existia não era nada, era menos que nada, permitia a consagração da fachada, da funcionalização. Quantos professores eram avaliados com o raríssimo "Não Satisfaz"? E quantos documentos apresentados nos relatórios eram consabidamente falsos? Quantos relatórios eram copiados a partir de outros?
É claro que concordo que há mais Professores que professores, mas o prejuízo causado por um só professor pode ofuscar, diminuir, impedir, sabotar, o trabalho de 10 Professores.Sou pela Avaliação, sim! Eu própria, ao atingir o 10º escalão, pedi, como era meu direito, para ser avaliada externamente à minha Escola. Porque não queria sair com o mesmo mísero "Satisfaz" de pelo menos três colegas que se aposentariam no mesmo ano que eu. Podem pensar que isto é orgulho, soberba, mesquinhice, demasiada auto-estima. Pois eu pensei que estava a fazer justiça ao meu trabalho como Professora! O que penso ainda é que a Avaliação, tal como a vejo, deve ser formativa, isto é, a sua principal finalidade deve ser melhorar o desempenho mais do que "catalogar" o docente como mau ou bom. Essa ideia criámo-la nós, Professores maiúsculos e minúsculos, quando usamos os testes para "ver" quem aprendeu e quem não aprendeu. Na minha óptica, os testes eram primeiramente para eu aferir o meu próprio trabalho e só interessavam se me permitiam ver o que tinha falhado com alguns e porquê. Logo, com os docentes a Avaliação tem de ter esse objectivo. Quem a usar para sobressair (como avaliador), para humilhar, para se vingar, para se apropriar de técnicas e estratégias dos avaliados não merece ser avaliador e deveria ser avaliado negativamente como tal.
Estamos todos no mesmo barco: queremos uma Educação melhor, uma Escola mais activa, mais atractiva, uma Relação interpessoal mais humana. Se a Avaliação não permitir tal, se for realizada com papel e lápis, tesoura e esquadro, fita métrica e relógio, sem alma, sem coração, sem solidariedade, sem justiça, então nem sequer vale a pena começar.
A Vida trouxe-me, mais uma vez, o que prova a infinita Bondade divina, outras obrigações que não me permitem dedicar tanto tempo ao blogue ou a comentários. Já agradeci a todos os que se interessam pela minha ausência e fazem o favor de gostar de ler o que me dita o coração e a cabeça, mas, realmente, tenho o tempo muito agradavelmente mais ocupado e, como em tudo, é preciso fazer opções...

sábado, 27 de setembro de 2008

Eu avalio, tu avalias, ele avalia...

Tinha uma enorme vontade de participar neste encontro de ideias sobre a Avaliação dos Professores mas sentia que pouca coisa de novo podia trazer à colação e por isso me tenho mantido em silêncio. Depois, comecei a lembrar-me de como sempre me bati pessoalmente ou em colaboração com Colegas por uma Avaliação dos Professores justa e, na quinta-feira passada, desloquei-me a uma Escola privada para um encontro com Alunos do 6º ano e tudo me voltou à mente.
Primeiro, e porque neste espaço pouca gente me conhece, começo por informar que o meu uso de maiúsculas é sempre intencional e significativo. Bem, o ambiente que encontrei nesta Escola que visitei fez-me um imenso bem: reconciliou-me com a Escola privada. Tudo o que pude apreciar me permite afirmar sem dúvidas que, ali, avaliar os Professores não vai ser difícil, sejam quais forem os critérios a ter em conta, incluindo, provavelmente, até os Pais e Encarregados de Educação. Para dar mais uma achega, a Escola tem mais de 1200 alunos, o que é obra.
Sei que estou a sonhar (mas não foi a sonhar que consegui tudo o que quis na Vida?), porque a realidade é profundamente diferenciada e não se deveria avaliar actores/acções diferentes com as mesmas medidas. Mas é preciso avaliar e confio que tal será possível a partir precisamente daqueles que, com razão, mais se preocupam com a Avaliação.
Por muito que nos custe, sabemos de antemão que são e serão os Professores mais dedicados, os Professores por vocação, que vão sentir mais na pele o que este sistema traz. Porque são esses os que se preocupam, os que se avaliam a si mesmos todos os dias na privacidade da sua consciência, após cada aula, após cada experiência, após cada teste. E, humanos que são, não podem nem querem ser avaliados como os professores "funcionalizados" que, em maior ou menor número, existem em todas as Escolas. Ser Professor é demasiadamente importante para ser trabalho de funcionários e, portanto, se não agimos como funcionários não podemos ser avaliados com os mesmos critérios. O Professor em cujas turmas alguns alunos não têm sucesso são os mesmos dos alunos que têm sucesso. Logo, o sucesso das turmas não pode ser critério de diferenciação. Mas a atitude do Professor perante o sucesso e o insucesso, por muito difícil que seja de Avaliação, essa, sim, merece sê-lo.
O Professor que reclama que não pode ser bom docente se tiver que permanecer 35 horas por semana na Escola, além das horas para as reuniões, está a lutar pela dignificação da sua acção. O Professor que "chora" o tempo que perde a preencher papéis criados por burocratas, tem todo o meu apoio e compreensão.
Mas se esse mesmo docente nunca tiver tempo para ir até ao recreio, se não for capaz de sacrificar um intervalo para ouvir um aluno ou uma turma inteira, aquele que não "vê" os Alunos quando passa por eles nos corredores e só é docente na sala de aula, esse não é Professor e pode ser facilmente avaliado: sem desprimor nem ofensa, como um simples burocrata.
Ora, o que eu temo é precisamente que a Avaliação, como estava prevista (há tanta mudança e medida avulsa!) "empurre" os Professores para a "funcionalização"! Mas, por outro lado, tenho a Certeza, mais do que a Esperança, de que em todas as Escolas há Professores que vão avaliar e ser avaliados dentro de um espírito de partilha que, sinceramente, eu não senti que existisse antes como factor de carácter geral: praticamente nunca conheci trabalho mais autónomo do que o docente. Será esse espírito de partilha, de entre-ajuda, que poderá fazer toda a diferença e os professores "funcionalizados" auto-excluir-se-ão naturalmente. O que significa que a sua avaliação será um processo fácil e, o que é mais importante, justo...
O que não poderemos evitar, na minha opinião pessoal e discutível, é que a Avaliação veio para ficar. Que, como qualquer mudança profunda (e eu desejaria que ela fosse causa de mudança de tudo o que está menos bem), ela vem sempre acompanhada de alguma injustiça que recai sobre os melhores. Mas que, após um curto período de tempo (assim seja!), ela acabará por se auto-regular. E então os bons e os maus serão facilmente reconhecidos como tal.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Agora que o Natal aí vem...

Pois é. Agora que o Natal aí vem, porque não tarda nada que as montras se encham de coisas que pretendem ser símbolos, que os anúncios se dirijam ao “espírito natalício”, que os pequenos comecem a pensar numa nova playstation, vou contar uma pequena história que me chegou aos olhos via Internet.
A minha conhecida presunção leva-me, até, a crer que a sua divulgação é um acto social...
Mike, como lhe chamam na Internet, passava a época do Natal de cenho franzido, incomodado com o seu aspecto comercial. Parecia que o Natal o irritava e a esposa encarava a tarefa de arranjar um presente para ele com a maior preocupação. Ora uma vez, quando o seu filho mais velho tinha doze anos, participou num campeonato escolar de luta livre em que a sua escola defrontava uma escola pobre das redondezas. O filho de Mike e os seus colegas, devidamente equipados, venceram com relativa facilidade aqueles meninos voluntariosos, alguns até muito bons, mas que competiam vestidos com as suas próprias T-shirts e com sapatilhas tão velhas que mal se seguravam nos pés.
A mulher reparou que Mike felicitou o filho com pouco entusiasmo e, a sós com ela, deixou escapar: "Gostava que ao menos um daqueles garotos tivesse ganho a sua partida. Alguns são mesmo bons, mas vão ficar desmoralizados. E ninguém sabe o que pode nascer dessa desmoralização". Isto passou-se a meio do primeiro período lectivo, meados de Novembro, e a mulher de Mike teve uma inspiração: logo que pôde, foi a uma loja de artigos desportivos e comprou camisolas e sapatilhas que mandou entregar naquela escola, para os alunos da classe de luta livre. Trouxe a factura, anexou-lhe uma cópia da carta que enviou com os presentes para a direcção da Escola, meteu tudo num sobrescrito e guardou. No dia de Natal, quando entregava as prendas à família, pegou no sobrescrito e deu-o ao marido, dizendo-lhe: "Toma, aqui tens o meu presente de Natal". Ele abriu, intrigado e ainda de cenho franzido, pelo que o sorriso largo e feliz que se lhe seguiu até aos próprios filhos espantou. Pedindo aos meus leitores que preencham os pormenores que se terão seguido, o que é muito mais interessante do que quer que seja que eu escreva, julgo que adivinham que, daí em diante, o presente de Mike deixou de ser um problema para a esposa: no ano seguinte comprou bilhetes e transporte para que crianças diminuídas mentais pudessem ir ver um jogo importante de baseball. Depois, enviou um donativo para dois irmãos que perderam a casa num incêndio na semana anterior ao Natal. O ponto alto da quadra era o mistério do que estaria dentro do sobrescrito de Mike. Os seus três próprios filhos ficavam tão suspensos do que seria, que pediam ao pai que o abrisse ainda antes de eles abrirem os seus próprios embrulhos.
De acordo com a história, Mike morreu no princípio de 2003 e a viúva hesitava se deveria ou não prosseguir com a tradição. Depois de pensar um pouco, decidiu continuar a ajudar alguém como um presente para Mike e, no Natal, junto dos presentes para os filhos e suas famílias, depositou o sobrescrito habitual. Os filhos, já de família constituída, chegaram e cada um deles, sem ter falado com os outros, trazia também um sobrescrito para Mike. Cada um com algo feito para outros que mais precisavam, em memória do pai.
Se, nesta altura da leitura, alguém começar a abanar a cabeça e a dizer que isto é treta, desengane-se: há mais exemplos destes do que aquilo que se sabe e quantos mais houver, melhor. Por mim e para já, entre outras coisas, adaptei o procedimento à família. O ano passado, sabendo que um dos meus filhos andava preocupado porque não sabia o que me havia de oferecer no aniversário, peguei o problema de caras e disse-lhe que uma coisa que me daria muito jeito seria arranjar a luz da cozinha (ele é muito jeitoso de mãos). Ofereceu-me e colocou uma luz "decente", como ele diz. Como estou quase a fazer anos outra vez, ontem, olhando para o tecto, disse-me: "Agora, com esta luz, é que se vê como o tecto precisa de pintura". Resposta minha: "Fica para o Natal".
Basta-me comprar a tinta... e em Dezembro terei, se Deus quiser, a minha cozinha pintada de novo, como presente. Quem é que disse que, afinal, o Natal não pode ser todos os dias?

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Com uma certa emoção...

Amigos, é com uma certa emoção que estou a escrever este poste. De facto, quando ontem, após uma certa ausência, retomei a escrita, nem sequer olhei para a última coisa que tinha escrito e muito menos para os comentários. Quando voltei a olhar com mais calma, vi que havia bastantes comentários que eu não tinha lido e que, mais do que uma referência ao conteúdo, eram uma prova de grande simpatia pelos meus despretensiosos escritos e mesmo de Amizade pela pessoa que sou.
Portanto, o que quero hoje é apenas agradecer a todos os que escreveram e aos que, não escrevendo nada, me "sentiram" a falta. Muita obrigada pela vossa benevolência.
Gostaria de partilhar convosco algo de bom: não vou ter tanto tempo para escrever no blogue, mas tal será apenas o resultado de assumir novas tarefas na minha vida que, imagino, me ocuparão algum do tempo que eu dedicava à escrita aqui.
Mas também pode ser que eu consiga conciliar as duas realidades e, por outro lado, a ausência pode ser uma boa medida para aferir a importância das coisas.
Não vou citar nomes de ninguém, mas quero que todos saibam que me puseram um nó na garganta e um sorriso nos lábios, dois aspectos só aparentemente antagónicos...
Para quem perguntou, o meu pé vai bem mas teima em dizer-me a idade e tenho que me habituar a isso. Até porque só se for pelo pé, pois o coração e a cabeça continuam com 20 anos por fazer...
Um abraço apertado e a minha gratidão para todos. Avó Pirueta

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Livros, livros, livros

As pessoas da minha geração têm, geralmente, uma tentação de conservar as coisas. Ou antes, têm dificuldade de se desfazerem das coisas. A Psicologia pode explicar os fundamentos para esta atitude com relativa facilidade, mas como sempre um pouco em contra-corrente, ando com uma vontade louca de arranjar coragem de me desfazer de mil miudezas, acumuladas em duas casas, ainda por cima. Dar, ninguém quer receber. Uma vez já fiz um leilão, tudo a um euro, e lá despachei umas coisas, mas havia uma motivação que levava as pessoas a comprar: a quantia apurada, devidamente registada, era para ser entregue numa obra em Moçambique.
Este preâmbulo serve apenas para eu expor um problema: o que tenho mais de meu, realmente meu, são livros. E não consigo arranjar coragem para me desfazer deles! Vejo-me aflita para resistir à tentação de comprar mais, o que é praticamente impossível, e depois não sei onde os hei-de pôr.
Bem, mas esta conversa de livros traz agarrada a si uma das coisas mais bonitas de que tive conhecimento como Professora. Não aconteceu comigo, mas garanto a verdade dos factos.
Numa escola dos arredores, durante a experiência da gestão flexível do currículo, o Presidente do Conselho Executivo conseguiu uma adesão extraordinária de toda a comunidade escolar para mudar algumas coisas: não havia campainha, os docentes planificavam em conjunto e quando um tinha necessidade de faltar avisava outro que estivesse livre (tinham os contactos e os horários uns dos outros) e os alunos estavam sempre acompanhados.
Por outro lado, sendo uma zona em que havia algum policiamento mais visível, alguns agentes colaboraram com o pedido feito de "acordarem" alguns alunos que não tinham quem os acordasse. Mas numa de serviço cívico e não de autoridade.
Outra particularidade que eu verifiquei foi a de que os pais eram chamados e recebiam uma espécie de "lições": o seu menino (!) precisava de tempo para brincar, portanto, nada de o obrigar a ir a correr buscar a avó ao centro de dia, ou levar-lhe o remédio, ou ir buscar o irmão à ama... Não é que não fosse bom ele fazer isso, mas tinha o direito a ser criança nem que fosse meia-hora. Além disso, precisava de um lugar para estudar - nem que fosse a mesa da cozinha - e precisava de um lugar certo para pôr os livros... Aí, houve uma gargalhada quase geral: "Lugar para pôr os livros? Quer que a gente compre uma estante, não? Ainda mais essa!"
Mas, pacientemente, se explicou que com dois tijolos e umas caixas de madeira de supermercado se fazia uma prateleira. Ele, Professor, quando se casara, tinha sido assim que resolvera o problema porque o dinheiro não abundava...
Bem, para encurtar a história, vamos ao importante: apesar dos cuidados, havia um aluno que estava quase a reprovar por faltas e como a montanha não ia a Maomé, foi Maomé à montanha: a directora de turma resolveu ir a casa do faltante e, chegando lá, encontrou o seu aluno à bulha com um vizinho e as mães já a começarem a puxar o cabelo uma à outra. A Professora tossiu (é uma maneira muito inteligente de chamar a atenção de alguém...) e a mãe do aluno apartou-se da outra e gritou para o filho. Oh Jorge, olha a tua Professora; anda-te embora qu'isso é gente que nem livros em casa tem!"
Que belo diploma aquela mãe passou àquela Escola!

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Línguas e leituras

Como sabem, estou naquela condição privilegiada de estar "em férias" mais ou menos permanentes e poder fazer, também mais ou menos, o que me apetece. Angola, este ano, está fora de questão, embora continue a fazer umas coisas para lá via Internet. Esta benção que Deus me mandou através de um pé partido, que me obrigou a olhar para dentro e para fora de mim, trouxe-me a sabedoria de aprender a ver os meus limites.
Mas, felizmente, tenho-me habituado a este ritmo a que nunca, nunca estive habituada: tenho usufruído, como nunca, da minha condição de idosa para viajar de comboio, tenho visitado Amigos que não via há anos (que bom, reencontrá-los como se nos tivéssemos visto ontem!) tenho lido e ando a aprender Esperanto.
Imaginem, eu a aprender esperanto nesta idade! Mas o facto é que esta "tarefa" me espevita, puxa por mim, abre-me horizontes. Aprender esperanto é, para mim, uma espécie de busca da língua única que todos os homens usariam, de acordo com a Bíblia, e que a arrogância associada à construção da Torre de Babel teria baralhado de tal forma que ainda hoje andamos a falar cada um para si, quantas vezes.
Aviso desde já que leio o episódio bíblico simbolicamente, mas não deixa de fazer muito sentido.
Poderia ter-me virado para o mandarim, que parece uma opção útil e necessária para os mais novos, mas se ainda sou capaz de plantar uma árvore sabendo que outros colherão os frutos (e eu os abençoarei por isso), não me apetece aprender uma língua só por utilidade.
Aprender esperanto tem qualquer coisa de incomum na sua aparente inutilidade. Digo "aparente" porque muita gente me pergunta o que é que me deu na cabeça... Ora, não deu nada demais nem de menos: talvez eu sinta essa língua como um elo universal e, ao mesmo tempo, como um código quase secreto.
Já agora gostaria de partilhar com os que me lêem que li um livro que pode ser um pouco perturbador, mas que para mim o não foi. Chama-se "O Evangelho segundo Pilatos", o seu autor tem muito a ver com a obra, e pacificou-me em relação a questões que se me punham há muito.
A biografia de D. Luís encheu-me as medidas, gostei de ler "Rainha Ginga" e de reler as obras do costume: "Não matem a cotovia", "Cem anos de solidão", "O Livro das Lendas" de Selma Lagerlof.
Ah, queria partilhar convosco uma alegria, entre as muitas com que Deus me abençoou: consegui, de facto, embora com ajuda, criar um jardim na minha varanda! What's a wonderful World!

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Mas não há ninguém que os ensine?

Há pouco estava a ver o noticiário da estação oficial. Uma apresentadora, aos gritos, tentava fazer-se ouvir por cima do ruído musical retro da inauguração do Tróia Resort. O assunto passou para estúdio e, logo a seguir, a mesma apresentadora resolveu falar com uma camponesa (sim, uma mulher do campo, vestida a preceito, e que andava a tratar da relva e dos jardins.
E que resolveu a jovem licenciada em jornalismo fazer? Perguntas estúpidas, paternalistas, complacentes, em que punha em causa uma série de valores sociais e profissionais. Perguntou-lhe se ela sabia o que era um resort. Depois, se ela contaria voltar lá. A senhora, candidamente, disse que talvez, se fosse preciso. E a menina, travessa, perguntou se ela sabia quanto custava viver ou simplesmente estar ali.
Fiquei indignada. Caramba, mas afinal não há ninguém que ensine boas maneiras a estes aprendizes de jornalistas? Já não basta a demonstração de ignorância com que tantas vezes nos presenteiam, temos também que aturar a falta de educação?
Haja alguém que ensine boas maneiras. Creio que é um campo com futuro: desde preparar autarcas para saberem apresentar-se em público e aprenderem a falar, até preparar todos os que vão a qualquer lado a representar Portugal e agora, praticamente, ensinar o que é delicadeza, respeito, consideração a todos os que lidam com o público. Desde empregados de balcão (desculpem, agora são assistentes de vendas - e por isso, só assistem, nós temos que fazer o resto...) até repórteres, jornalistas, entretendedores(!), há uma multidão de gente que julga que tem alguma classe quando humilha (ou tenta humilhar) os outros. Sem respeito pela idade, posição, nada.
Quando é que eu recomeço a dizer bem? Ah, para não levar nenhum ralhete indirecto, se calhar o melhor é fechar a loja... Mas, de qualquer maneira, eu também não gosto de dizer mal. Logo, ou há assunto ou não há.

Onde estará a Virtude?

Diz-se que os provérbios ou ditados são sabedoria, pois foram criados a partir de milhentas ocorrências que pareciam garantir a sua Verdade para além do Tempo. Pois já sabemos que não é assim, visto que a tecnologia (ia a chamar-lhe progresso mas desisti a tempo) tem mudado as coisas. Por exemplo, um ditado antigo dizia que "mal vai a Portugal se não há três cheias antes do Natal". Ora as barragens tiraram significado a um provérbio muito útil num país predominantemente agrícola mas que agora nada significa. Outro dizia: "se quiseres comer bem, come as ervilhas com os ricos e as cerejas com os pobres". Este felizmente vai desaparecendo, mas queria simplesmente dizer que as melhores ervilhas eram as primeiras, tenrinhas, mas tão caras que só os ricos as podiam comprar, enquanto as melhores cerejas são as últimas, aquelas que já ficam tão baratas que até os pobres se podiam deliciar com elas.
Na minha aldeia havia um ditado que nunca ouvi em mais lugar nenhum e que era, por si só, todo um tratado sobre a situação de pobreza do Portugal rural (e note-se que esta aldeia está a uns 15km de Coimbra). Como os pais mandavam as crianças "roubar" fruta aos pomares ou fruteiras quando estes lhes pediam pão, corria este: "Da cereja ao castanho, bem me avenho; da castanha ao cerejo, mal me vejo". O que significava que, a partir de Maio, com as primeiras cerejas, até Novembro, com a chegada das castanhas, as crianças tinham muito por onde enganar a fome. Mas de Novembro a Maio, o caso fiava mais fino, porque não havia fruta. Sei de quem enganava o estômago com flor de marmeleiro, que é das primeiras a aparecer, muito adocicada. Já provei. E acho muito interessante a inversão do género da fruta, para rimar a preceito.
E que tem isto tudo a ver com o título? É que se diz que "no meio está a virtude"... Será?
Não sei porquê, isto faz-me lembrar a "aura mediocritas" e fico logo desconfiada. Não gosto muito de médias. Lembro-me logo de que se tu comeres uma galinha e eu nenhuma, na média comemos ambos meia galinha...
Pois é: eu gostaria de saber onde está a Virtude. E já agora dizer que apreciei ontem uma personalidade da nossa praça política, de clara e conhecida prática cristã católica, afirmar que certas acções que fazemos valem bem por vinte missas. Dão-se alvíssaras a quem disser quem o disse, a que acções se referia e em que local ou meio se exprimiu.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Lições de Português

Antes de falar nas "Lições", deixem-me agradecer todos os comentários e palavras tão amigas e simpáticas que foram deixando enquanto eu preguiçava. Acontece que, como venho repetindo, custa-me não ter coisas bonitas, positivas, para falar delas. Mas acontece também que, só agora, finalmente, vi algo que me agradou imenso e quero partilhá-lo convosco.
Tudo porque o meu novo fornecedor de TV por cabo inclui a TV Globo e ainda ando por ali a ver quantos canais tenho, o que apresentam, etc. Por motivos que não vêm agora ao caso, tenho tido insónias e só adormeço tarde. Mas continuo a acordar cedo...
Ora, já percebi que o sono é essencial e, por isso, de manhã. pelas seis, sete horas, ligo o aparelho que está no meu quarto para um canal onde haja notícias em Português. E a meia voz... Normalmente traz-me o sono de volta. Pois nestes últimos dias, a essas horas matinais, tenho encontrado um belíssimo programa, muito bem feito, a ensinar Português. No Brasil. E não é Português de favela nem de telenovela de prime-time. É bom Português! Os exemplos, as explicações, os actores, as sequências, tudo do melhor. E vai-me aquecendo a alma não ouvir "Vêjamos, póssamos, deiamos, sêjamos, etc".

As preposições pedidas por alguns verbos aparecem inseridas em contextos naturais, adequados. Enfim, um regalo para os meus ouvidos exigentes. Um programa como nunca vi na nossa TV, nem sequer naquele que passou há relativamente pouco tempo com o Diogo Infante. O actual "Bom Português" da RTP1 da manhã é quase 99 por cento baseado em ortografia. Importante, sim, mas que pobreza! Quando será que aparece um programa como o brasileiro? Com explicação dos conectores? Com frases bem estruturadas? Com exercícios de pontuação?
Enquanto não vem, aproveito para dizer que o meu pé direito, com os seus parafusos, placa e prego, está recuperado a uns 95%, o que é muito bom na minha provecta idade. No entanto, a meta a atingir, são os 100%, claro. E vamos vencer. A Vanessa, o Nelson e eu: três medalhas!
Viva Portugal!
PS: Já me ofereci ao Comité Olímpico para ensinar "a estar" e boas maneiras para participantes em futuras Olimpíadas. Graciosamente. Aguardo resposta...

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Os frades e a salsa

Conta-se que uma comunidade de frades vivia em contemplação e na mais estrita frugalidade. Assim, 365 dias por ano, 366 nos anos bissextos, eles comiam ao almoço o equivalente a três colheres de arroz, um pedacinho de carne, isto enfeitado com um raminho de salsa.
Um belo dia, sem qualquer justificação, o pedacinho de carne não apareceu e ninguém disse nada. Obedientemente, comeram o arroz, calados. Daí a umas semanas, veio só o arroz em cada prato. Aí, um dos monges, mais jovem, pediu para falar e disse, dirigindo-se ao Superior: "Pai, eu quero o meu raminho de salsa, se me permite":
E o Superior respondeu: - "Mas porquê, meu filho? Antes de mandar retirar a salsa, tive o cuidado de verificar que ninguém a comia. O raminho de salsa ficava sempre no prato":
Resposta do "reclamante": - "Sim, Pai, isso é verdade. Mas mesmo assim quero a minha salsa. Há tempos tiraram-nos a carne e nós calámo-nos. Agora tiram-nos a salsa. Se nós não dissermos nada, qualquer dia tiram-nos também o arroz! E depois?"

Quem tiver olhos para olhar, veja! Quem tiver ouvidos para ouvir, ouça!

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Falta de brio profissional

A foto de hoje, tirada no dia 2 de Agosto numa parede do meu quarto, é um verdadeiro exemplo de brio profissional e de espírito inventivo. Resolvi mudar de fornecedor das tecnologias domésticas (tv por cabo, internet, telefone) e no dia 23 de Julho apareceu-me cá um "técnico"
que logo na sala me deixou um bocado admirada: colocou a chamada box no soalho, quando tinha por cima uma prateleira vazia que, aliás, estava aí para o efeito.
Fiquei na sala enquanto ele foi para o quarto, tivemos um ligeiro quiproquo por causa da Internet, assinei o papel e o homem foi-se embora "porque já eram 6 horas".
Quando cheguei ao quarto ia-me dando um ataque: Como o cabo era curto, o homem, em vez de me chamar, não esteve com meias medidas: pegou numa caixa que eu tinha à vista, depois colocou-lhe um leitor de cassetes por cima, mais uma cassete e colocou a box na vertical!
Nessa altura eu ainda andava com duas canadianas (agora é só uma) e notem o perigo que era eu andar por ali.
Não refiro o servidor, pois assim que reclamei foram impecáveis, pediram-me para fotografar e reclamar. Como tal me tinha sido pedido expressamente, assim o fiz. Por motivos meus, só vieram repetir todo o serviço no dia 2 de Agosto e ficou tudo numa boa.
Agora gostaria de saber se este funcionário (que era extra-empresa, pertencendo, portanto, a uma empresa subcontratada) é feliz. Não pode ser! Como ser feliz, como pode gostar de si alguém que é capaz de apresentar um serviço tão mal feito! Tive pena dele, porque tenho a certeza de que há algo que ele gostaria de fazer, em que se aplicaria, em que teria brio. Mas isso não desculpa o trabalho feito. Assim como não perdoo que as pessoas se desculpem de fazer as coisas mal feitas ou demoradas "porque ganham pouco". É uma questão de princípio: quando se aceita fazer algo é para ser bem feito!

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Eufemismos


Vivam todos os Amigos que aqui fiz e que devem estar mais ou menos todos a gozar merecidas férias. Tenho achado um tanto ou quanto digno de menção o facto de a maior parte das pessoas com quem tenho contactado só se considerarem estar de férias quando partem para algum lado.
Ora eu que, neste momento, profissionalmente, digamos que estou sempre de férias, lembro-me de que "férias era (e ainda é) sair da rotina, fazer coisas diferentes. E uma delas era gozar, usufruir, a minha casa, em que passava tão pouco tempo durante o dia. Férias, para mim, significavam uma grande volta à casa, às coisas, aos hábitos domésticos, assim como que um "retiro de ménage". E uma ou duas semanas na casa da aldeia.
Depois, férias significaram, durante anos, além do retiro doméstico, (não esqueçamos que esse eram já muito boas férias) campismo (ou antes, caravanismo), pic-nics, em que o Pai ensinava aos filhos os nomes das plantas, dos animais, das rochas. Em que se oferecia um "Corneto" a quem lavasse a louça toda bem lavada e a arrumasse nos sítios. Até que eles casaram e férias eram o retiro mais um passeio a dois por Portugal e pela Galiza, de carro, sem destino marcado, ao correr da nossa vontade.
Agora, que não tenho rotinas, é sempre férias, mesmo em casa. Mas quando saio olho bem para o que se vê por essa cidade fora e um dia destes, ia eu com um bom Amigo (agora não é eufemismo...) e vimos este anúncio, ali para os lados do Carvalhido e não pudemos deixar de soltar uma bela e saborosa gargalhada: Cirurgião de esgotos! Em Português e em Inglês! É assim mesmo!
Pois é assim mesmo porque nós vivemos num tempo de eufemismos. Não se reprova - fica-se retido; não se morre -falece-se; as oficinas que lavam carros chamam-se agora "estética-auto". E esta falência generalizada em que, pelo menos aparentemente, se vive, designa-se por "crise".
Pois é, eu tencionava ter começado ontem mas estava à espera de boas notícias para comentar ou apresentar. E dessas apenas posso referir que a minha empregada interrompia todos os dias as suas merecidas férias para vir regar o meu jardim varandal enquanto estive na aldeia. É ou não digno de nota?

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Divirtam-se, descansem, cultivem(-se), vivam um pouco mais devagar

Amigos,
como felizmente a minha Caixinha de Afectos se tornou muito grande e tenho receio de, por velhice, me esquecer de algum nome, não vos vou nomear. Mas quero deixar aqui a todos os Amigos, a todos os que me adoptaram como Avó, os votos muito profundos de que tenham umas óptimas férias. Vou sair da cidade por uns tempos e quero embeber-me na paisagem aldeã o mais completamente possível, o que não inclui Internet...
Portanto, por uns tempos, dou-vos descanso da minha presença diária. A todos, o meu Amor. Sim, Amor. Amizade é uma forma de Amor. Escrever um poste porque alguém conta com ele é uma forma de Amor. Fazer um comentário é uma forma de Amor. Amar é tão simples! E dar descanso também o é, ora essa!
Estou-vos imensamente grata pela paciência com que trataram esta anciã (!) e a recepção que me deram. Contem comigo para aquilo que eu possa ajudar. Trabalhar faz bem. E há tanta coisa em que posso ajudar: rever textos, fazer pesquisas, sei lá que mais! Estou aqui! Um abraço blogosférico ... Avó Pirueta

Vou dar férias... Vou para férias... E fazer bagi...

Ora, meus Amigos, eu agora estou naquela fase mágica da vida em que não tenho horários de trabalho, faço o que quero, às horas que quero, portanto, estou sempre de férias.
Aparentemente, mas de facto, mesmo as actividades em que me meto fazem parte do meu prazer de férias.
Por isso, e depois de passar a receita do bagi de batata para o Clap; Clap, Clap, etc. Clap, o que vou fazer de seguida, vou também dar férias: aos Amigos que me lêem e ao blogue.
Aproveitem bem, organizem-se, amem, beijem, abracem, digam às pessoas que amam que as amam, não deixem nada dessas coisas para amanhã. Porque, reparem:

É manhã. Já canta o galo.
Já canta o galo. É manhã.
Já canta o galo? Deixá-lo!
Quem sabe se vão matá-lo
E já não canta amanhã?!
O mundo está cheio de galos
que não cantam amanhã!


Clap, aqui vai o bagi de batata
Ingredientes para 3 ou 4 pessoas: 4 batatas grandes ou 6 médias; uma cebola grande, bem picada; duas colheres de sopa bem cheias de sementes de mostarda castanha; 10 folhas de caril; 4 malaguetas verdes, uma colher de chá de cominhos moídos; uma colher de chá bem cheia de açafrão das Índias; coentros frescos; 3 colheres de óleo de amendoim; alguma água.
As folhas de caril e as sementes de mostarda compram-se nas lojas dos indianos. As folhas de caril deveriam ser frescas e chamam-se, na verdade, folhas de caripat. Não há frescas mas há estas secas que servem muito bem.
Descasca-se as batatas e cortam-se em cubinhos de uns 5mm de lado. Quando estiverem todas cortadas, cobrem-se com água e sal e devem ficar assim pelo menos 10 minutos.
Num tacho, põe-se as três colheres de sopa de óleo de amendoim e quando estiver quente, lança-se as sementes de mostarda e deixam-se estalar. Junta-se a cebola ficada e fica a estrugir um bocado. Quando começa a gritar por água, juntamos as batatas escorridas, as folhas de caril, as malaguetas cortadas aos pedaços e o açafrão. Mexe-se e acrescenta-se água. Deve ficar no fim com muito pouco líquido. Coze em fogo lento e quando as batatas estiverem praticamente cozidas junta-se os cominhos e, a terminar, os coentros frescos cortados aos bocados, mesmo à mão.
Serve-se assim, como aperitivo ou com um simples ovo estrelado ou escalfado, serve de refeição.
Espero que gostes e informo que hoje fiz o bolo de cenoura com a cobertura de chocolate e estava uma delícia...

domingo, 27 de julho de 2008

Hoje foi a pensar em Henrique V, de Inglaterra

Lawrence Olivier no papel de Henry V, na batalha de Azincourt
Hoje acordei a pensar no discurso de Henrique V, na peça de Shakespeare com o mesmo nome e que o Rei fez aos seus pouco mais de 10 000 soldados que se preparavam para lutar com mais de 60 000 franceses. Foi no dia de S. Crispim ou S. Crispiniano (25 de Outubro de 1415) e aparece muitas vezes referenciado como "O Discurso de S. Crispim". Para o entendermos melhor é bom que recordemos que muitos cavaleiros da mais alta nobreza pensavam desistir devido à enorme disparidade de forças, especialmente o conde de Westmoreland, primo do monarca. Mas o Rei galvanizou-os para a vitória de Azincourt (Guerra dos Cem Anos) com o seu discurso. Que vos apresento numa tradução nem muito livre nem muito fiel.
Aqui vai;
"Quem expressa esse desejo de mais soldados? Meu primo Westmoreland? Não, meu simpático primo; se estamos destinados a morrer, o nosso país não tem necessidade de perder mais homens do que nós temos aqui; e, se devemos viver, quanto menor for o nosso número, maior será a parte da honra para cada um de nós.
Pela vontade de Deus! Não desejes nem mais um homem, te rogo! Por Júpiter! Não sou avaro de ouro, e pouco me importo se vivem às minhas expensas: pouco me importa que outros usem as minhas roupas: essas coisas externas não encontram abrigo entre as minhas preocupações. Mas se ambicionar a honra é pecado, sou a alma mais pecadora que existe. Não, por fé, não desejes nenhum homem mais da Inglaterra. Paz de Deus! Não quereria, pela melhor das esperanças, expor-me a perder uma honra tão grande, que um homem a mais poderia talvez querer compartilhar comigo. Oh! Não anseis por nenhum homem a mais! Proclama antes, através do meu exército, Westmoreland, que aquele que não for com coração à luta, poderá retirar-se: dar-lhe-emos um passaporte e poremos na sua mochila algum dinheiro para a viagem; não queremos morrer na companhia de um homem que teme morrer como companheiro nosso.
O dia de São Crispim: este dia é o da festa de São Crispim; aquele que sobreviver a este dia voltará são e salvo ao seu lar e colocar-se-á na ponta dos pés quando se mencionar esta data, ele crescerá sobre si mesmo ante o nome de São Crispim. Aquele que sobreviver a este dia e chegar à velhice, cada ano, na véspera desta festa, convidará os amigos e lhes dirá: "Amanhã é dia de São Crispim". E então, arregaçando as mangas, ao mostrar-lhes as cicatrizes, dirá: "Recebi estas feridas no dia de São Crispim."
Os velhos esquecerão; mas, aqueles que não esquecem tudo, lembrar-se-ão todavia, com satisfação, das proezas que levaram a cabo neste dia. E então os nossos nomes serão tão familiares nas suas bocas como os nomes dos seus parentes: o rei Harry, Bedford, Exeter, Warwick e Talbot, Salisbury e Gloucester serão ressuscitados pela recordação viva e saudados com o tilintar dos copos. O bom homem ensinará esta história ao seu filho, e desde este dia até o fim do mundo, a festa de São Crispim e Crispiano nunca chegará sem que venha associada à nossa recordação, à lembrança do nosso pequeno exército, do nosso bando de irmãos; porque aquele que verter hoje o seu sangue comigo, por muito vil que seja, será meu irmão, esta jornada enobrecerá sua condição e os cavaleiros que permanecem agora no leito em Inglaterra considerar-se-ão como malditos por não estarem aqui, e sentirão a sua nobreza diminuída quando ouvirem falar daqueles que combateram convosco no dia de São Crispim."
Levantei-me e fui ler o texto: em inglês e nesta tradução que fiz há tempos e fiquei a pensar: "Por que é que me lembrei deste discurso? " Neste momento, penso que sei. Sei que temos uma grande batalha a travar pela verdadeira Educação, somos poucos a enfrentar muitos, mas será uma honra nunca esquecida se conseguirmos arrumar esta casa. Infelizmente (e não sou nada de me queixar da idade), precisaria de ter menos 20 anos. E esta ira que não considero pecado, esta vontade de fazer valer o que é importante, esta coragem de denunciar o que é trabalho de impostores.

sábado, 26 de julho de 2008

Ser ou não crente

Ontem mostrei como um Pai mostrou ao filho o que era a verdadeira coragem. Hoje, se me permitem, quero falar de Amor. Por causa de Deus.Por causa dos deuses. Por causa do Medo. Por causa da Esperança.
Hoje há uma ideia de que a Fé, a religiosidade, pela menos a católica, está a decrescer. O Homem, se acredita em alguma coisa, dizem, acredita em si próprio. Há também, trazida pelos media, a ideia de que religiões como o islamismo por uma lado e religiões orientais, como o budismo e o hinduismo, estão a seduzir cada vez mais pessoas.
Não contesto nem confirmo nenhuma destas ideias. O que eu sinto é que, apesar de tudo, as pessoas procuram Deus. Procuram-n'O nos lugares mais estranhos, mas procuram-n'O. Porque eu sinto que a nossa vida precisa de Deus como meta e farol.
Há muitas pessoas que dizem que a Igreja é que estragou a Fé. Ora, quando dou catequese, a primeira coisa que digo aos meninos é que a Igreja que nos interessa não é aquele edifício feito de pedra, de barro, de paus e folhas secas. Isso é uma casa, que, mais tarde, pode servir para outra coisa qualquer. A Igreja são os cristãos todos juntos. Mas, entre adultos, ouso ir mais além: a Igreja é o conjunto de todos os Homens e Mulheres de Boa Vontade que vivem de acordo com a verdadeira consciência, a ética, a solidariedade.
A Igreja tem afastado crentes por ser constituída por homens e mulheres que, humanos que são, fraquejam. Ora eu não acho que nos devamos afastar daquilo em que acreditamos porque outros fazem mau uso disso. Cada um é livre, pois Deus fez-nos livres de escolher como agir e viver.
Portanto, quando ouço dizer a alguém que não é crente, não acredito à primeira. E, em 80% dos casos tenho razão: as pessoas já crêem nessa altura, já andam preocupadas com Alguém que lhes faz falta para as preencher completamente. Já andam à procura sem o saberem.
É claro que também há os deuses: o dinheiro, a fama, o orgulho, o poder, só para citar os mais conhecidos.
Mas todo aquele que não deseja mal, que não faz mal, que respeita os outros, que os ajuda se e quando necessário, que está presente sempre que é preciso, que é capaz de partilhar o que é seu com outros (seja riqueza, conhecimento, sentimentos), esse é crente. Esse é um ou uma entusiasmada pela Vida, pelo Outro, pela Terra. E esta palavra quer dizer, etimologicamente, "ter o deus em si".
É claro que temos o outro lado da questão - o que diz: eu sou crente mas não vou à Missa. E por que não? É um sinal público de que se crê. Porque Jesus disse que Ele estaria onde estivessem dois ou mais reunidos em Seu nome. E quem estiver sozinho? Não se preocupe. Afinal, eu estou convencida (Deus me perdoe) que as igrejas se enchem de gente sem Fé, sem Esperança, sem Amor. Por hábito. Por vista. O que interessa é que façamos o que façamos, o façamos com convicção e Amor.
Deus, o meu Deus, que é o de toda a gente, não é uma Pessoa. É Amor. É Alegria. É Compaixão. Deus é uma Festa contínua, mesmo quando sofremos, porque conseguimos ver algum objectivo no nosso sofrimento.
Ele conhece-nos a todos, um por um. Ama-nos tanto que colocou entre nós o Seu Filho Deus, Jesus Cristo. O que fez Jesus de extraordinário? Milagres? Não, Jesus nem sequer gostava de fazer milagres. Ele pedia que não os contassem a ninguém. Jesus viveu em Verdade. Viveu e morreu como um Homem, com a única diferença de que achava que todos eram dignos de Amor. E que o Amor era para se mostrar, fazendo, agindo e não simplesmente rezando.
Portanto, meus Amigos que dizeis que não sois crentes, como agis de acordo com os principais mandamentos - de facto, só há um: amai -vos uns aos outros - sois crentes. O que, não tendo eu nada com isso, me faz feliz. Porque talvez eu me torne mais capaz de me encontrar um dia com todos os que amei num lugar de infinita Alegria e Paz. Desculpem a homilia.
PS. Sei que corro riscos, mas isso é um risco de quem tem Fé e a quer mostrar. E um dia destes, vou dizer-vos o que penso da deserção do encontro dominical...

Receitas prometidas, porque o prometido é de vidro...


Não precisam de legenda, pois não?

Então, como o prometido é de vidro e não quero que se quebre, aqui vai o meu bolo de cenoura (que geralmente faço num tabuleiro e não numa forma redonda):
Ingredientes:
1/2 chávena (chá) de óleo
3 cenouras médias raladas na varinha mágica
3 ovos
1 chávena e meia (chá) de açúcar
2 chávenas (chá) de farinha de trigo
1 colher (sopa) de fermento em pó só rasa, isto é, mal cheia.

Como se faz:
Antes de mais nada, barra-se um tabuleiro ou forma com manteiga e salpicado de farinha e liga-se o forno a 180º.
1. Bate-se tudo no liquidificador, primeiro a cenoura com os ovos e o óleo, depois os outros ingredientes, um a um, misturando tudo, menos o fermento.
2. No fim, junta-se o fermento, misturando-o com uma colher de pau autorizada pela ASAE;
3. Vai ao forno pré aquecido (l80ºC) durante 40 minutos. Se for em tabuleiro, como é mais baixo, é melhor verificar pelo método científico do palito a partir dos 30 minutos.
Cobertura:
Esta cobertura é uma perdição e raramente me permito fazê-la cá em casa por causa das curvas mas é óptima!!!
Derreto uma tablete de chocolate no micro-ondas, depois despejo e mexo, ao mesmo tempo, uma lata de leite condensado magro, até estar tudo bem homogéneo e cubro o bolo. Depois contem-me!
Bolinhos de chuva
Os bolinhos de chuva, nome brasileiro, são os conhecidos belhós da Beira Litoral, que se fazem num instante, especialmente quando aparece alguém e estamos desguarnecidos...
Eu faço assim: uma chávena grande de farinha de trigo já com fermento, 2 duas boas colheres de leite em pó, 2 colheres de açúcar, 2 ou 3 ovos, raspa de limão. Misturo tudo com um garfo ou batedeira e acrescento a água ou leite necessário para ficar uma massa fluída e a fazer bolhas. É muito rápido. Depois, frito às colheradas, deixo escorrer e polvilho com açúcar e canela.
Estes eram os meus presentes no Ofertório em espécie para os meus queridos padres italianos.
Bom apetite.
Ainda cá hei-de voltar hoje, se o Senhor quiser, mas com uma receita de Deus.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Não matem a Cotovia ou O que é a Coragem?


Jem, o filho mais velho do Dr. Atticus Finch está a entrar na adolescência e tem uma certa "vergonha" do Pai porque, tendo casado tarde, não partilha com o filho muitas brincadeiras: cansa-se a jogar a bola, não pode subir a árvores, etc. Numa tarde de Verão aparece na rua um cão com raiva e, com grande espanto de Jem e de Scout, a filha, todos imediatamente se lembram de ir ao seu consultório buscá-lo, porque sabem que ele é o único capaz de matar o animal, misericordiosamente, com um só tiro. Então Jem pensa que afinal o Pai é um homem de coragem por possuir essa capacidade. Vou transcrever o diálogo entre Pai e filho sobre o que é a Coragem. A conversa decorre depois de ele ter sido chamado a casa de Mrs Dubose, uma senhora à antiga que sofria tantas dores que era obrigada a tomar morfina, receitada pelo médico, e que acabara de morrer. Mas quis morrer livre dessa prisão e sofreu horrores quando deixou, por sua livre vontade, de a tomar. Nesses momentos de sofrimento pela falta da droga - creio que se chama síndrome de abstinência - Jem, de castigo (não vou contar a história toda aqui...) lia-lhe um livro. Entretanto, mais uma vez os meus olhos se iluminaram ao ver aquele que sempre considerei o meu Actor preferido...

- O que é que ela queria? - perguntou Jem.
- Ela morreu, filho. Faleceu há alguns minutos.
- Oh, -murmurou Jem - Bem...
- Bem, exactamente - comcordou Atticus. - Já deixou de sofrer. Esteve doente durante muito tempo. Filho, não sabes o que eram aqueles ataques? - Jem abanou a cabeça - Mrs Dubose era viciada em morfina. Tomava-a como analgésico. O médico dela é que lha receitara. Ela teria de viver o resto da vida dependente da droga e morreria sem muitas dores, mas era demasiado caprichosa... Mrs Dubose disse-me que queria libertar-se do vício antes de morrer e foi isso que fez.
- Queres dizer que os ataques dela eram por causa disso? perguntou Jem.
-Sim, eram por causa disso. Durante a maior parte do tempo em que lias duvido que ela ouvisse uma palavra do que dizias. A sua mente e o seu corpo estavam concentrados naquele despertador.
- Ela morreu livre? perguntou Jem.
- Como o ar da montanha - respondeu Atticus. - Esteve consciente até ao fim, quase. (...) Filho, disse-te que se não tivesses perdido a cabeça, eu ter-te-ia obrigado a ires ler-lhe. Queria que descobrisses nela uma coisa... queria que visses o que é a verdadeira coragem, em vez de ficares com a ideia de que a coragem é um homem com uma arma na mão. Coragem é quando sabes que foste vencido ainda antes de começares, mas começas apesar disso e acabas o que tens a fazer., independentemente do que possa acontecer. É raro ganhar-se mas às vezes acontece. Mrs. Dubose ganhou, com os seus quarenta e quatro quilos. Segundo as suas noções, ela morreu sem dever nada a ninguém. Foi a pessoa mais corajosa que conheci.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Ofertas e Ofertórios

Esta fotografia foi tirada na Igreja de Marracuene, em Moçambique, num domingo de Maio de 2006, porque estou com um casaco, o que significa que está frio. E como "em Roma, sê Romano", também não dispensei a capulana à volta da cintura, roxa como convinha a uma viúva. Lembrei-me de a ir buscar para ilustrar um pequeno texto que irei "roubar" a Harper Lee, na sua única obra escrita "Não matem a cotovia".
Mas primeiro deixem-me explicar de que trata a foto: é o Ofertório em espécie. Embora haja um Ofertório em que quem pode oferece uma moeda (e parece que não há absolutamente ninguém que não dê), há depois o ofertório em espécie, em que os fiéis dão do que têm para o sustento dos seus párocos. Em Marracuene eram, há dois anos, dois Padres italianos, ainda jovens. Agora o mais jovem já voltou para Itália por motivos de saúde.
Como se vê, cada pessoa leva do que tem: banana, coco, abacaxi, batata doce, abóbora, quiabos, um peixe seco ou fresco (nunca vi mais do que um por Missa), massarocas e, nos dias grandes (Páscoa, Natal e no dia da festa da Igreja) uma galinha.
Os padres terão que se governar com o que recebem, as moedas valem muito pouco e sobrevivem porque a sua Congregação os ajuda. Mas vivem com muita frugalidade, iso posso garantir.
Ora, se repararem bem, ali vou eu na procissão e levo um tabuleiro coberto com um pano branco. O que levo? Um bolo de cenoura que os padres adoravam. Coitadinhos (as Irmãs da minha Congregação tinham a mania de dizer que eu pensava que eles eram meus filhos), com uma vida tão espartana, pelo menos ao domingo tinham um miminho.
A descrição prolongou-se - a Missa também, porque nunca demorava menos de 3 horas, bem mexidas, com cantos e danças - e o texto do livro fica para outra vez. Era também a descrição do ofertório numa Missa numa igreja de negros em Atlanta, onde o pastor mandou fechar a porta para ninguém sair até a colecta dar 10 dólares, quantia que ele achava o mínimo para ajudar uma família em apuros. A descrição é feita a partir dos olhos e da inocência de uma garota de 6 anos e é uma delícia.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Para que servem os livros?

Em tempos que já lá vão pedi ao escritor e poeta Manuel António Pina que fosse à "minha" Filipa falar com alunos e professores, na inauguração da nossa nova biblioteca, sobre livros. Foi no dia 23 de Abril de 2002. Sem lhe pedir autorização, passo a transcrever o que ele disse e que hoje pode ser visto emoldurado na dita biblioteca. Esta escolha faz parte da minha terapia de cura...

PARA QUE SERVEM OS LIVROS?

Há muitos anos, num infeliz livro de Joaquim Namorado, li um aflitivo poema intitulado “Viagem aos Mares do Sul”, cuja estrita prosa dizia qualquer coisa do género “Eu não fui lá”. Quem, como eu, tivesse andado por aqueles mares todos com Salgari, e Stevenson, e Somerset Maugham, e também com Gauguin, e por esses mares e pelos outros com Conrad e com Fernão Mendes Pinto, e tivesse viajado por África com Roussel, ido à Lua com Júlio Verne e com Cirano de Bergerac, e a Vénus e a Nova Iorque com Ray Bradbury, e aos pólos com Jack London, ou tivesse andado atrás do ouro do Alasca com Charlot, e do ouro californiano com Blaise Cendrars, e tivesse vivido todo o género possível de aventuras, na China, no Tibete, nos Andes, nas Arábias, e um pouco por todo o lado, com Tintin, e tivesse combatido em Tróia com Aquiles e Agamémnon, descido aos Infernos com Ulisses, e iludido Circe, e vencido os pretendentes, durante horas tiradas ao sono e às sebentas, ou com Rilke, com Elliot, com Pessoa, tivesse andado perdido pelos obscuros territórios da alma e dos sentidos, haveria de ter tido, como eu, uma pena imensa da incapacidade do poeta para sair de casa.

Para isso servem também os livros, para sair de casa. E a pintura, o cinema, a música. E para regressar, quando os olhos e o coração se cansam, a casa.

Borges imaginou o mundo como babilónica biblioteca; os cabalistas imaginaram-no como um imenso livro por ler. E Rilke evoca, julgo que no “Livro das Horas”, as vastas mãos de Deus que folheiam o Livro do Princípio, que é o Livro do Mundo porque, como ensina Thomas Brown, a arte é a natureza do homem e a natureza é a arte (e a literatura) de Deus.

Tudo está eternamente escrito. E eternamente, e cesarinymente, em Quito. Isto é, em qualquer sítio da estante. O leitor é um Deus fugaz, e o escritor é provavelmente um leitor lendo por escrito. Não há Mares do Sul, não há Lua, não há alma, fora dos livros e de nenhuma outra forma é possível ir seja onde for levando-nos a nós próprios. Eu é que sei, que já me aconteceu, uma vez ou outra, e por dever de ofício, estar nos Alascas sem Jack London, e em Verona sem Shakespeare, e voar sobre o Pólo Norte sem Júlio Verne, e andar por Tóquio e por Kyoto sem Bashô, e por Macau sem Camilo Pestana, e pelo Nordeste sem João Cabral e sem João Guimarães Rosa, e por Lisboa sem Cesário, e por dentro e por fora de mim próprio sem Pessoa e sem Santa Teresa de Ávila; eu é que sei, que não há outra forma de ir, nem de estar, seja onde for. Escrever livros, e ler livros, ou cantar, ou pintar, é a única forma de sair de casa. De viver, como está escrito no Livro do Tao.


terça-feira, 22 de julho de 2008

Onde estão a Ética, a Solidariedade e o Bom-Senso?

Devo estar doente. Mas não se preocupem. É, a ser, o tipo de doença que eu mesma terei que tratar. Os sintomas são estranhos: vejo e leio coisas e não acredito, pelo que estou a ganhar a paranóia de que todos se conluíaram para me enganar.
Por exemplo, li num jornal de hoje que, em Itália, duas crianças morreram afogadas e os seus corpos ficaram algum tempo nas areias da praia, à espera de serem retirados. Entretanto, os banhistas que enchiam o areal procederam como se nada se tivesse passado: brincaram, nadaram, jogaram, comeram, beberam, mesmo ao pé dos corpos infantis mal cobertos por uma toalha. E alguém insinuou que aquela indiferença cruel se deveria, talvez, ao facto de as crianças serem ciganas.
Vocês, os Amigos que me lêem, podem fazer-me o favor de me dizer se isto é verdade?
A minha empregada, mais minha filha que empregada, recebeu um telefonema para ir trabalhar para mais uma casa. E isso porque, sendo só nós agora, ela e eu, a Gorete tem muito mais tempo livre e pode ganhar mais. Ela continua comigo porque, além da amorável companhia que me faz, nós, eu e o meu Marido, a convencemos a fazer uma compra na base de que, enquanto um de nós fosse vivo, ela teria emprego. E avisámos os nossos filhos.
Bem, mas a Gorete tem o horário super-cheio e disse que não podia. No entanto, iria telefonar a alguém que estava livre e lhe parecia de confiança. Telefonou, à minha frente, a uma jovem de 33 anos que vive do Rendimento Mínimo. Que não aceitou, porque, palavras dela, não dobrava as costas por cinco euros por hora para limpar a casa dos outros. A Gorete jura que esta foi a resposta e assim também me pareceu. Mas isto pode ser verdade?
Não temos dinheiro para mandar cantar um cego, mas garantem-me que a penúltima ministra da Cultura gastou uns bons milhões só para preparar a possível vinda de um pólo do Museu Hermitage. A Inglaterra não aguentava os custos de manter o pólo. Parece, de facto, um raciocínio lógico: eles não aguentavam mas nós não somos desses... E agora ficou tudo em águas de bacalhau. Dizem-me e também li no jornal. Poderá ser?
Muitos Professores podem ser excelentes, verdadeiramente excelentes, mas só em privado, com a sua consciência e junto dos seus alunos. Porque, com os seus pares, já é mais difícil eu acreditar que sejam vistos assim. O Governo destinou quantos excelentes poderia haver por escola! Não pode ser verdade! Alguém anda a tentar fazer com que me sinta louca.
Os ciganos têm orgulho nas suas tradições mas já não lhes apetece ser nómadas. Muito bem. Dizem que por aqui estão há 500 anos. Melhor ainda, porque eu estou há muito menos tempo e juro que sou portuguesa. Querem ser portugueses, tratados como portugueses, mas não ter que agir como os portugueses fazem em geral: pôr os filhos na Escola, tratar das vacinações, ter emprego e fazer descontos, coisas assim comezinhas. Só se alguém lhes der um empurrãozinho. Excepto que grande parte também recebe o tal rendimento mínimo. Não querem ser discriminados, mas também não querem viver com negros. Uns e outros, a viver em casas de renda económica, guerreiam-se e já se toma partido. Geralmente pelos mais claros. Mas quem eu ontem vi na TV, a marchar pela Paz, foram os escuros! Alguém me anda a enganar!
Amigos, este não é o Portugal em que quero viver. E mesmo quanto ao que se passou em Itália, vou adiantando que esta também não é a Europa a que quero pertencer. Sou exigente: não me importo de dormir no chão, de tomar banho de chuva, de passar um mês ou dois sem comer carne, mas sinto-me mal a viver num pais e num continente onde a Ética está moribunda, a Solidariedade está de férias e o Bom-Senso foi enterrado com música e foguetes, como numa Queima das Fitas. Isto num Pais que nasceu em 1143.
Digam-me, por favor, que tudo isto é mentira.
PS. Por favor, se comentarem, não se cansem a falar da corrupção africana, que eu não nego que exista. Só que "quem tem telhados de vidro não deve andar à pedrada" e não é de bom tom cuspir para o ar.